CARTA ABERTA AO PRIMEIRO MINISTRO

por Pedro Sousa em 20 de Dezembro de 2011

em País

“Exmo Senhor Primeiro Ministro

Começo por me apresentar, uma vez que estou certa que nunca ouviu falar de mim. Chamo-me Myriam. Myriam Zaluar é o meu nome “de guerra”. Basilio é o apelido pelo qual me conhecem os meus amigos mais antigos e também os que, não sendo amigos, se lembram de mim em anos mais recuados.

Nasci em França, porque o meu pai teve de deixar o seu país aos 20 e poucos anos. Fê-lo porque se recusou a combater numa guerra contra a qual se erguia. Fê-lo porque se recusou a continuar num país onde não havia liberdade de dizer, de fazer, de pensar, de crescer. Estou feliz por o meu pai ter emigrado, porque se não o tivesse feito, eu não estaria aqui. Nasci em França, porque a minha mãe teve de deixar o seu país aos 19 anos. Fê-lo porque não tinha hipóteses de estudar e desenvolver o seu potencial no país onde nasceu. Foi para França estudar e trabalhar e estou feliz por tê-lo feito, pois se assim não fosse eu não estaria aqui. Estou feliz por os meus pais terem emigrado, caso contrário nunca se teriam conhecido e eu não estaria aqui. Não tenho porém a ingenuidade de pensar que foi fácil para eles sair do país onde nasceram. Durante anos o meu pai não pôde entrar no seu país, pois se o fizesse seria preso. A minha mãe não pôde despedir-se de pessoas que amava porque viveu sempre longe delas. Mais tarde, o 25 de Abril abriu as portas ao regresso do meu pai e viemos todos para o país que era o dele e que passou a ser o nosso. Viemos para viver, sonhar e crescer.

Cresci. Na escola, distingui-me dos demais. Fui rebelde e nem sempre uma menina exemplar mas entrei na faculdade com 17 anos e com a melhor média daquele ano: 17,6. Naquela altura, só havia três cursos em Portugal onde era mais dificil entrar do que no meu. Não quero com isto dizer que era uma super-estudante, longe disso. Baldei-me a algumas aulas, deixei cadeiras para trás, saí, curti, namorei, vivi intensamente, mas mesmo assim licenciei-me com 23 anos. Durante a licenciatura dei explicações, fiz traduções, escrevi textos para rádio, coleccionei estágios, desperdicei algumas oportunidades, aproveitei outras, aprendi muito, esqueci-me de muito do que tinha aprendido.

Cresci. Conquistei o meu primeiro emprego sozinha. Trabalhei. Ganhei a vida. Despedi-me. Conquistei outro emprego, mais uma vez sem ajudas. Trabalhei mais. Saí de casa dos meus pais. Paguei o meu primeiro carro, a minha primeira viagem, a minha primeira renda. Fiquei efectiva. Tornei-me personna non grata no meu local de trabalho. “És provavelmente aquela que melhor escreve e que mais produz aqui dentro.” – disseram-me – “Mas tenho de te mandar embora porque te ris demasiado alto na redacção”. Fiquei.

Aos 27 anos conheci a prateleira. Tive o meu primeiro filho. Aos 28 anos conheci o desemprego. “Não há-de ser nada, pensei. Sou jovem, tenho um bom curriculo, arranjarei trabalho num instante”. Não arranjei. Aos 29 anos conheci a precariedade. Desde então nunca deixei de trabalhar mas nunca mais conheci outra coisa que não fosse a precariedade. Aos 37 anos, idade com que o senhor se licenciou, tinha eu dois filhos, 15 anos de licenciatura, 15 de carteira profissional de jornalista e carreira ‘congelada’. Tinha também 18 anos de experiência profissional como jornalista, tradutora e professora, vários cursos, um CAP caducado, domínio total de três línguas, duas das quais como “nativa”. Tinha como ordenado ‘fixo’ 485 euros x 7 meses por ano. Tinha iniciado um mestrado que tive depois de suspender pois foi preciso escolher entre trabalhar para pagar as contas ou para completar o curso. O meu dia, senhor primeiro ministro, só tinha 24 horas…

Cresci mais. Aos 38 anos conheci o mobbying. Conheci as insónias noites a fio. Conheci o medo do amanhã. Conheci, pela vigésima vez, a passagem de bestial a besta. Conheci o desespero. Conheci – felizmente! – também outras pessoas que partilhavam comigo a revolta. Percebi que não estava só. Percebi que a culpa não era minha. Cresci. Conheci-me melhor. Percebi que tinha valor.

Senhor primeiro-ministro, vou poupá-lo a mais pormenores sobre a minha vida. Tenho a dizer-lhe o seguinte: faço hoje 42 anos. Sou doutoranda e investigadora da Universidade do Minho. Os meus pais, que deviam estar a reformar-se, depois de uma vida dedicada à investigação, ao ensino, ao crescimento deste país e das suas filhas e netos, os meus pais, que deviam estar a comprar uma casinha na praia para conhecerem algum descanso e descontracção, continuam a trabalhar e estão a assegurar aos meus filhos aquilo que eu não posso. Material escolar. Roupa. Sapatos. Dinheiro de bolso. Lazeres. Actividades extra-escolares. Quanto a mim, tenho actualmente como ordenado fixo 405 euros X 7 meses por ano. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. A universidade na qual lecciono há 16 anos conseguiu mais uma vez reduzir-me o ordenado. Todo o trabalho que arranjo é extra e a recibos verdes. Não sou independente, senhor primeiro ministro. Sempre que tenho extras tenho de contar com apoios familiares para que os meus filhos não fiquem sozinhos em casa. Tenho uma dívida de mais de cinco anos à Segurança Social que, por sua vez, deveria ter fornecido um dossier ao Tribunal de Família e Menores há mais de três a fim que os meus filhos possam receber a pensão de alimentos a que têm direito pois sou mãe solteira. Até hoje, não o fez.

Tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: nunca fui administradora de coisa nenhuma e o salário mais elevado que auferi até hoje não chegava aos mil euros. Isto foi ainda no tempo dos escudos, na altura em que eu enchia o depósito do meu renault clio com cinco contos e ia jantar fora e acampar todos os fins-de-semana. Talvez isso fosse viver acima das minhas possibilidades. Talvez as duas viagens que fiz a Cabo-Verde e ao Brasil e que paguei com o dinheiro que ganhei com o meu trabalho tivessem sido luxos. Talvez o carro de 12 anos que conduzo e que me custou 2 mil euros a pronto pagamento seja um excesso, mas sabe, senhor primeiro-ministro, por mais que faça e refaça as contas, e por mais que a gasolina teime em aumentar, continua a sair-me mais em conta andar neste carro do que de transportes públicos. Talvez a casa que comprei e que devo ao banco tenha sido uma inconsciência mas na altura saía mais barato do que arrendar uma, sabe, senhor primeiro-ministro. Mesmo assim nunca me passou pela cabeça emigrar…

Mas hoje, senhor primeiro-ministro, hoje passa. Hoje faço 42 anos e tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: Tenho mais habilitações literárias que o senhor. Tenho mais experiência profissional que o senhor. Escrevo e falo português melhor do que o senhor. Falo inglês melhor que o senhor. Francês então nem se fale. Não falo alemão mas duvido que o senhor fale e também não vejo, sinceramente, a utilidade de saber tal língua. Em compensação falo castelhano melhor do que o senhor. Mas como o senhor é o primeiro-ministro e dá tão bons conselhos aos seus governados, quero pedir-lhe um conselho, apesar de não ter votado em si. Agora que penso emigrar, que me aconselha a fazer em relação aos meus dois filhos, que nasceram em Portugal e têm cá todas as suas referências? Devo arrancá-los do seu país, separá-los da família, dos amigos, de tudo aquilo que conhecem e amam? E, já agora, que lhes devo dizer? Que devo responder ao meu filho de 14 anos quando me pergunta que caminho seguir nos estudos? Que vale a pena seguir os seus interesses e aptidões, como os meus pais me disseram a mim? Ou que mais vale enveredar já por outra via (já agora diga-me qual, senhor primeiro-ministro) para que não se torne também ele um excedentário no seu próprio país? Ou, ainda, que venha comigo para Angola ou para o Brasil por que ali será com certeza muito mais valorizado e feliz do que no seu país, um país que deveria dar-lhe as melhores condições para crescer pois ele é um dos seus melhores – e cada vez mais raros – valores: um ser humano em formação.

Bom, esta carta que, estou praticamente certa, o senhor não irá ler já vai longa. Quero apenas dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: aos 42 anos já dei muito mais a este país do que o senhor. Já trabalhei mais, esforcei-me mais, lutei mais e não tenho qualquer dúvida de que sofri muito mais. Ganhei, claro, infinitamente menos. Para ser mais exacta o meu IRS do ano passado foi de 4 mil euros. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. No ano passado ganhei 4 mil euros. Deve ser das minhas baixas qualificações. Da minha preguiça. Da minha incapacidade. Do meu excedentarismo. Portanto, é o seguinte, senhor primeiro-ministro: emigre você, senhor primeiro-ministro. E leve consigo os seus ministros. O da mota. O da fala lenta. O que veio do estrangeiro. E o resto da maralha. Leve-os, senhor primeiro-ministro, para longe. Olhe, leve-os para o Deserto do Sahara. Pode ser que os outros dois aprendam alguma coisa sobre acordos de pesca.

Com o mais elevado desprezo e desconsideração, desejo-lhe, ainda assim, feliz natal OU feliz ano novo à sua escolha, senhor primeiro-ministro. E como eu sou aqui sem dúvida o elo mais fraco, adeus.

Myriam Zaluar, 19/12/2011

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1 F Santos 21 de Dezembro de 2011 às 17:54

Apetece-me dizer: apoiado.

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2 inquieto 23 de Dezembro de 2011 às 16:03

ora vivam!!

é um caso para dizer: estou estarrecido!!
miles de vezes, estarrecido!

podia dizer, pq até me apetece muito fazê-lo, que é a maior injustiça do mundo!

mas, meus caros, isto não representa mais que uma rasteira e muito desfocada ideia, do que uma sociedade é, especialmente nos tempos modernos!!
E diga-se, apoiada por uma certa intelectualidade de esquerda, de vistas curtas e de rabo à medida do sofá.

É que por muito que o tentes, nunca consegues livrar os teóricos da tua banda, pois tem dedo deles!

que tenhais um BOM NATAL,

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3 João Marques 4 de Janeiro de 2012 às 17:21

Os meus parabéns pela coragem e pelo modo como escreveu, com coragem,clareza e objectivos bem definidos, mas que infelizmente a canalha governante pretende escorraçar deste país.
Manda emigrar o que Portugal tem de melhor para acarinhar os Romenos, Ucrânianos e muitos formados com formaturas duvidosas, apoiando toda a canalhada que tem espalhado o terror de diversas formas facultando-lhes o RSI e muitas das vezes negando-o aos verdadeiros necessitados.
Subscrevo por inteiro a sua opinião, eu próprio gostava de ver emigrar esta canalha que se assolou do poder, e que ao longo destes anos todos deu provas de incompetência, criando reformas chorudas com meia duzia de anos no activo, e que na maior parte do tempo nem sequer lá vão. A única coisa que os políticos sabem fazer é negociatas. Isso é devido ao facto de eles não saberem o que é trabalhar, porque só sabem é encostarem-se a um partido para serem promovidos, e como é do conhecimento geral quanto mais incompetente maiores as possibildades de subir na hierárquia.
Aos que vão defendendo esta canalhada argumentando com esquerda e direita lembro-os que os responsáveis foram: (PPD/PSD, PS, CDS/PP), sózinhos ou em coligação sempre foram eles a governar e a contrair as dívidas, roubando o dinheiro e agora aparecem a falar como que nada tenham a ver com a situação. A politica seguida após a adesão à CEE foi uma política de TRAIÇÃO À PÁTRIA.

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4 pinto soares 11 de Fevereiro de 2012 às 0:14

Como cidadão português escrevo isto para o primeiro ministro que anda a matar os pobres á fome, anda a tirar as empresas do nosso país e a mandar os portuguêses lá para fora. mas naconalisa estrangeiros que depois lhe dá rendimento minimo e eles tem com ocupação diária fazer asssaltos e matar pessoas indefesas.Agora pergunto-lhe porque é que os pobres tem que pagar uma divida que não fizeram quem roubou e desviou o dinhei ro foi a classe politica por isso esses é que são os responsaveis pela miséria do país deviam de estar eram todos presos incluindo o primeiro ministro. o primeiro ministro e a ceita dele já se imaginaram a viver com 400 euros de subsidio de desemprego ou trabalhar na contrução civil e ganhar 580 e manter os fihlos e a mulher com esse dinheiro, porque é que não mandas os teus filhos primeiro ministro para o estrnageiro trabalhar para a construção civil porque é melhor viver ás custas do nosso dinheiro ou porque são muito piegas, tiras aos pobres para dar para ti e para os restantes politicos que estão contigo, onde é que está o dinheiro que foi roubado e desviado dinheiro esse que era para a melhoria do nosso país e foi roubado onde estão essa pessoas que roubaram o dinheiro.Se o pais está em crise foram os politicos que assim o poseram quem roubou o dinheiro que era para o bem estar dos portugêses agora que pague e que sejam julgados por isso os contribuintes portugêses não são pais dos politicos.Se não fosse a classe pobre não haviam ricos neste país os pobres é que fazem a ecónomia do país , se não fosssem os pobres este país era um deserto não haviam empresas nem construção nada só havia politicos.O país está na miséria e compra-se carros topos de gama da com o dinheiro dos contribuintes para o senhor primeiro ministro andar e a familia vá trabalhar no seu carro eu vou no meu e ganho 500 euros e ninguém me paga nada. há muito mais para dizer primeiro ministro mas tinha que estar aqui um ano a falar.Os portuguêses é que não tem nada que andar a pagar para os politicos e as familias deles nem carros nem viagens nem casa o país não é seu primeiro ministro nem do resto dos politicos o país é dos portugueses . acabe com a corrupção na politica com as regalias que tem os deputados da assembleia juises e tudo o que gasta dinheiro nosso para o seu conforto e não é preciso a troika para nada essa nazi que mande no país dela quer agora mandar nos outros que ponha os alemães a ganhar 500euros e a trabalhar 8 horas por dia que ela vê para onde vai ela eo país.Vá trabalhar no seu carro primeiro ministro e ponha a sua familia a trabalhar numa empresa 8horas por dia a ganhar 500 euros para ver o que é bom os portugêses tenhem filhos deles não são da assembleia da republica corte ao seu ordenado e desse politicos todos da asembleia que é com o nsso dinheiro que recebem e ainda andam de carro á nossa conta vai trabalhar para as obras para ver o que custa a vida e nada de pieguisse ,o estado em que se encontra o país é por vossa culpa corta aos ordenados dos politicos e o país lá não precisa de ajudas onde é que se meteram e metem milhões de euros que entram nos cofres do estado de portagens ,ivas, taxas moderadoras ,descontos para segurança social , das multas dos conductores, dos estacionamentos , imposto automóvel e muito mais .
Já agora os contribuintes tem que pagar o roubo que foi feitom no bpn paga-o tu e os que roubaram o banco andas agora a tiraar aos pobres que ganaham uma miséria e andas a tirar dinheiro para manter corruptos não são os portuguêses que tem que pagar isso paga tu e quem roubou o dinheiro.gostava que isto fosse publicado nos jornais e publicado nos noticiários e se chegares a ler isto primeiro ministro começa a trabalhar tu e os outros politicos porque o país ´não é vosso é dos portuguêses não custa nada viver á nossa custa e das nossas dificuldades, não cartôes de crédito nem carros para vós andares á custa dos portugÊses nem as vossa familias ide todos trabalhar.

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5 isabel 23 de Março de 2012 às 19:20

Hoje não pensamos politicamente. Pensamos forçosamente em pessoas, em fatos, em medidas que nos entram portas “adentro” e nos fazem desacreditar num país melhor… Pensamos em leis, em circunstancias existenciais… Hoje somos fruto do que de mal se fez, e se faz politicamente. A nossa existencia depende em excesso das ditas medidas… hoje não podemos ser felizes. Hoje nao pensamos em politica, temos medo dela. Hoje sofremos com as medidas do governo… Porque politicamente pensa-se em finanças e economia. Hoje nao se pensa em pessoas… Estranho… mas de fato hoje não se pensa em pessoas…. não se governa para pessoas… governa-se exacerbadamente para números… valores… Valores não queria dizer “pessoas de bem e de proncipios”?… Pois, mas hoje não se pensa em pessoas.

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6 alfredo cunha 26 de Dezembro de 2012 às 14:35

olàs enhor primeiro menistro pelos vistos eu queria lhe enviar uma carta de felis latal , mas ouve muitas mais pessoas que jà o fisero : nao vou estar a preder muito o seu tempo , mas o senhor primeiro menistro ainda se lembra das primeiras palabras que o seu pai lhe disse quando o senhor ganhou as eleissoes :estàs tramado pà
E porquê porque se mostrava um mas!
você ou tu que mais duque eu nao és e se tiveres duvidas quando nos deitarmos na nossa ultima caminha vais ver as difrenças
Agredesso muito coragen da senhora que trabalha na unibercidade do minho,gostei e gostei porque tambem sou emigrante e filho de emigrante e esto so porque sou do pais que se dis erois do mar; olhe para o passado desse pais e ganhen vergonha pois àcho que està na ora o que jà tivemos por esse mundo e hoge nao à nada atenas dividas, quen foi foi o trolha ou o agricoltor , nao foi os politicos dessa nassao abaira mar pelantado,hoge em dia portugal formas emenssos medicos e continua a nao ter medicos porque serà senhor primeiro menistro olhe parece que jà é preciso até fechar postos de saude ,erois da vergonha so se for: senhor primeiro menistro hoge en dia lembre-se niguen mas ninguen neste mundo manda em ninguen ,bosse que tem estudos leia esto com atençao e desculpe là alguns erros mas enfilismente ainda à muitos e piores duque eu em potugal ;:————erois do mal para os pobres sobre os mantos dos ricos: e despessume disendo o que mais me conssola é que tambem murreis :sao palabras de alguen que leva uma vida de austeridade e jà é capàs de de calquer coisa acinado 1000 0000 588 DE 88

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