«No Orçamento do Estado de 2011, o valor alocado ao rendimento social de inserção foi diminuído em 20%. Em 2012, desceu outros 20%, de 440 milhões de euros para 370. Num momento de máximo histórico do desemprego, quando se espera que este aumente e com ele o número de pessoas em situação desesperada, o último recurso previsto encolhe 40%.
Como? Porquê? Para quê? Há oito dias, o ministro da tutela explicou: moralizando. Doravante, disse, o RSI tem “novas regras”. “Passa a ser um contrato entre o beneficiário e o Estado, com direitos e deveres”. Entre os novos deveres, enumerou, estão a obrigatoriedade de as crianças do agregado irem à escola e de inscrição no centro de emprego para quem recebe a prestação – cancelada para presos condenados. Medidas acertadas, sem dúvida, que só podem deixar toda a gente a pensar que raio de pouca-vergonha se praticava antes – mais um sinal do tão imoral e irresponsável despesismo que, de acordo com o Governo, nos trouxe aonde estamos. Não admirando que o ministro conte assim poupar – mais exatamente 70 milhões – tirando dos malandros pobres para dar aos pobres honrados, ou seja do RSI para as pensões mínimas.
Maravilha, hã? Era. Se esta história não estivesse tão bestialmente mal contada. É que, apesar de o Governo anterior ter tentado (com mais fiscalização e novas regras) diminuir o número de beneficiários do RSI, este aumentou consideravelmente entre setembro de 2011 e fevereiro de 2012, ou seja, já sob a tutela de Mota Soares, de 312 mil (116 mil famílias) para 323 mil (121 mil famílias), tendo o valor médio mensal por família aumentado de 240 para 244 euros e o individual de 89 para 91 euros (o que corresponde a mais vinte milhões de euros). Outra é que as “novas regras” que Mota Soares anunciou existem desde 1996, quando o RSI foi criado, então com o nome de rendimento mínimo garantido, pelo Governo Guterres – sempre foi assinado um acordo entre Estado e beneficiário; este sempre teve de estar inscrito no centro de emprego; sempre as crianças do agregado tiveram de frequentar a escola; sempre a prisão efetiva determinou o cancelamento da prestação.
O que nos leva ao busílis: como é que Mota Soares tenciona cortar os 70 milhões? O Público de ontem levanta o véu: o Governo vai alterar o cálculo da prestação, penalizando as famílias e sobretudo aquelas com crianças – que poderão passar a contar apenas 30% em vez dos atuais 50% do rendimento de referência.
Que tal venha de um ministério do PP, o partido do “visto de família” não pode já surpreender ninguém, como não surpreende que o tenha ocultado. Surpresa mesmo é ainda haver tanto quem ecoe acriticamente a indecorosa propaganda deste Governo. E que não ocorra a ninguém perguntar o que este prevê para quem perde o acesso ao RSI. É que se é só contas que contam, parece que cada preso custa 40 euros por dia, 1200 por mês. Fora o que fica para trás – e para a frente. Que tal pensarmos nisso?» [DN]
Fernanda Câncio
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